por Teresa Melo
HÚMUS
pontualmente e as extremidades são só coisas naturais:
como dizer que os cardos são mansos
que os flamingos voam para saturno
e que é na humidade da terra
que se completa o mundo.
***
CANÇÃO-VENTRE
suavemente sossegada
é a voraz carnívora
tecida em rendas e aguaceiros
a camélia que no ventre afaga
o toque de uma precipitada língua
e dança na trepidação mais pura
dos nervos, da água.
fêmea em lágrimas e pérolas
no medo é fascínio
que ora sussurra em chamas
ora habita em silêncio
e entra no amor de qualquer maneira
quando invoca o delírio da natureza
que é o meu corpo em fúria.
***
SANTIAGO
escapo-me à confusão dos âmagos
para contemplar as plantas exóticas
a plumagem âmbar dos pássaros
e os privilégios verbais do espírito.
cedo aprendi a falar com as polpas dos dedos
são nadadores exímios de danças curtas.
à meia sombra os impulsos
têm raízes e a folhagem é tenra.
nunca bebi nem fogo nem tempo
mas entendi que um coração extasiado em suor
é o melhor material de observação
porque amplia o modo como nos metemos para dentro
ou procuramos sair de nós. ***
Esses poemas serão publicados em breve no livro As abelhas não dançam bachatas, de Teresa Melo, pela Cas'a edições.
Imagem: capa do livro As abelhas não dançam bachatas, ilustrado por Tamires Z. Costa.