por Fernanda Xavier
partido o amor a distância posta o tempo a varrer as folhas secas artefatos
ouço sua voz.
procurei por ela quando sua caligrafia me atingiu o rosto -
meu corpo é feito de um papel de relevo irregular, que retém água das tintas
manchado agora pelo vinho entornado na mesa posta por você a minha espera
atônita
posta a procura.
eu entoava a sua palavra repetidamente procurando ali uma correspondência um gesto desejo de espelho imersa em mistério
poderia aquela caligrafia retornar as folhas secas às minhas mãos?
se o fizesse, eu teria a habilidade de tomá-las novamente e ler
o que elas contam
o desenho que se faz em seu corpo vegetal?
tudo é turvo sem essa memória esparramada no chão e
a terra é muito seca pra que eu possa enxergar o que se passa
há muito tempo não chove aqui.
encontrei a voz, solta
e agora ouço em silêncio
todo um universo sonoro é fundado por ela
e finalmente chove
lavando o chão
onde recolho, agora ofegante, uma folha antes enterrada sob a terra seca
tomo-a nas mãos e escuto o canto
da ave selvagem que habita o texto.