por Gabriela de Andrade Pereira
sob o sol
o espaldar vazio da cadeira
é uma elegia
***
Plath
suas mãos tentaram
materializar
os pensamentos que contÃnuos
escorregavam de seu corpo –
captaram a violência rubra
das tulipas
enquanto você se fechava
na brancura estéril
(ventre e olhos ocos)
somente as mãos estavam manchadas
por tulipas
as mesmas mãos que ligaram o gás
naquela manhã fria –
chegara finalmente a redenção
do branco atormentado
pelo arfar vermelho das flores –
pequenas bocas em que se articulavam
vogais a subirem
vazio afora
***
Pelo espelho
este rosto rasgado pelos dias –
de cada homem
surgiu uma escara
e cada gozo sentido
era uma morte solitária
um clarão a perpassar o corpo
um devir lançado ao vento –
agora olho para este quarto
onde ecoam ainda tantos gemidos
misturados às cortinas rotas
aos velhos lençóis de tecido barato
e às paredes cheias de fissuras
e teias de aranha
escondidas sob a iluminação fraca.
Sou um resto de glória
um quebranto a esta meia-luz.
***
O caos após o silêncio –
o signo em colapso
pelo palavrório contÃnuo.
Algaravias se insinuam no branco –
água-viva
a roçar a beira
das realidades
Imagem: capa do livro A realidade é uma palavra (Cas'a edições). Desenho de Julia Panadés. Coleção Livros MÃnimos.